Ainda hoje tendemos a entendê-los como sinónimos.
Se nasci como menina, ou seja se apresento uma vulva, um xx, e caracteres sexuais secundários, irei sentir-me e identificar-me como uma mulher e irei 'naturalmente' orientar-me sexual e romanticamente para uma relação com um homem. Irei também ser 'feminina' (seja lá o que isso fôr) e vestir-me e comportar-me como uma mulher (seja lá o que isso fôr também)... Ora, nós somos bem mais interessantes - e menos lineares - do que isso. Por isso é que, muitas vezes, o pensamento binário (homem/mulher, pénis/vagina) não é muito rico nem traduz muito bem a nossa identidade e a nossa expressão enquanto pessoas. Falar de um contínuo é bem mais interessante e tende a ilustrar de um modo mais adequado as nossas relações e vivências. Mas, mesmo quando falamos de um contínuo, continuamos a ter como referências discursivas a masculinidade e a feminilidade. Parece que não conseguimos sair dessa divisão. Há uma proposta que me parece explicar muito bem, e de uma forma simples, a diferença entre sexo, género e orientação sexual. Foi desenvolvida por Sam Killerman e podem ver mais sobre isso aqui. Falamos então em: - Identidade de género: podemos pensar na identidade de género em torno de ser mulher e de ser homem. Falamos da personalidade, de traços, de papéis e de expectativas. - Expressão de género: aqui estamos no domínio de como nos apresentamos, se de um modo mais masculino ou feminino em termos da roupa, maquilhagem, aparência e cabelo. - Sexo anatómico: o sexo anatómico é aquele que é usualmente utilizado para identificar uma pessoa e estamos a falar dos cromossomas sexuais, da genitalidade, das hormonas e dos caracteres sexuais secundários. - Orientação sexual & Orientação romântica: dirigida a mulheres femininas e/ou pessoas femininas ou homens masculinos e/ou a pessoas masculinas Uma vez mais, estas quatro dimensões devem ser pensadas num contínuo e não de uma forma linear. Mesmo no sexo anatómico, a dimensão mais biológica de todas se quisermos, há variações na genitalidade à nascença que, por vezes, não permite perceber claramente se se trata de um pénis ou de uma vulva. E depois é só fazer combinações para percebermos a riqueza da (dita) natureza humana. E para perceber que ao continuarmos a pensar as pessoas em termos de homens/mulheres e pénis/vaginas perdemos muito da sua complexidade. Se quiserem mesmo fazer classificações e colocar categorias em relação ao sexo anatómico e à identidade de género, podemos falar em cisgénero (quando o género que nos é dado à nascença coincide com a nossa identidade de género) e em transgénero (quando o género que nos é dado à nascença não coincide com a nossa identidade de género). O género é essencialmente uma construção social. O sexo, e a importância definidora que lhe atribuímos, também. Já dizia Simone de Beauvoir, no seu livro O Segundo Sexo, "não nascemos mulheres, tornamo-nos mulheres". E o que é que isto quer dizer? De uma forma muito simples, há um conjunto de características que associamos ao identificarmos-nos e ao expressarmo-nos enquanto homens e/ou mulheres que são aprendidas, moldadas, selecionadas, escolhidas, ensinadas de modo a nos apresentarmos e a nos sentirmos como mulheres e/ou como homens (em diferentes graus). Continuamos a dividir o mundo em homens e em mulheres e por vezes o mundo parece ter tanta certeza o que cabe a cada um. A mim causa-me tanta indignação as possibilidades que excluímos a homens e mulheres, apenas por termos essas lentes binárias. E o que obrigamos homens e mulheres a terem que ser... Quando se está grávida a pergunta que se ouve mais (até mais do que 'está tudo bem?') é 'o que é que é?'. Não deixa de ser interessante como parece ser TÃO importante lermos as pessoas em termos de mulheres e homens. Porque quando se pergunta o sexo do bebé, não se está a perguntar apenas sobre a sua genitalidade, mas sim sobre o seu género e sobre a sua orientação sexual. Que brincadeiras irá privilegiar, como se vai comportar, o que lhe vai ser permitido e promovido. E o que lhe será excluído... A entrevista da Anabela Mota Ribeiro à extraordinária Gabriela Moita é muito interessante e fala muito sobre isso. Podem lê-la aqui. Raquel Freire, no livro Transiberic Love diz algo com o qual me identifico muito e penso ser uma boa mensagem para deixar no final deste post: Somxs todxs pessoas. Comments are closed.
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Sofia B. SousaPsicóloga Clínica Arquivos
May 2023
Este blog tem objetivos educativos e informativos.
E não deve ser considerado como forma de terapia e acompanhamento psicológico. |